Enedina Alves

— Maria Eduarda Brandão


Desafiou os padrões acadêmicos e sociais ao ser a primeira mulher a concluir engenharia no Paraná e se tornar a primeira engenheira negra no Brasil.

Nascida em 13 de janeiro de 1913 na cidade de Curitiba no Paraná, Enedina Alves teve uma trajetória marcante na história brasileira apesar de sua pouca visibilidade e notoriedade na história. Filha de Paulo Marques e Virgília Alves Marques, seus pais foram para Curitiba em busca de melhores condições de vida devido ao êxodo rural advindo da abolição da escravidão em 1888. Após o divórcio, Virgília, sua mãe, que trabalhava como doméstica, passou a morar e trabalhar para a família de Domingos Nascimento, um major e delegado intelectual republicano; Isabel, filha de Domingos, tinha a mesma idade de Enedina. Por isso, o delegado matriculou a filha da empregada nas mesmas escolas que sua filha.

A infância de Enedina consistiu na realização de trabalho doméstico em casas de famílias e, também, no aprendizado. Alfabetizada na Escola Particular da Professora Luiza Netto Correia de Freitas, em dezembro de 1931, conseguiu diploma de professora normalista e, assim, passou a trabalhar na rede pública de ensino no interior do estado do Paraná. Posteriormente, Enedina voltou a trabalhar em casas de família como mecanismo para alcançar seus objetivos pessoais, mesmo que estivesse trabalhando como professora. Foi nesse período, mais precisamente no ano de 1940, que conseguiu ingressar na Faculdade de Engenharia da Universidade do Paraná, onde graduou-se em Engenharia Civil em 1945, ao seu lado formaram-se 32 homens. Seu feito é tão significativo pois até então, em todo o território nacional, somente quatro mulheres já tinham se graduado em engenharia, e todas pela Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Assim como antes dela, apenas dois negros haviam se formado engenheiros na mesma Instituição de Ensino. A partir desse momento, Enedina lutou para conquistar seu espaço intelectual numa área ocupada majoritariamente por homens.

Em 1946, um ano depois de se graduar, Enedina atuou como auxiliar de engenharia na Secretaria de Viação e Obras Públicas, também no Estado do Paraná. Depois, foi chefe de hidráulica, chefe da divisão de estatísticas e do serviço de engenharia, na Secretaria de Educação e Cultura do Estado. No ano seguinte, Enedina deu início ao auge da sua carreira em um novo local: o Departamento Estadual de Águas e Energia Elétrica do Paraná, onde ela atuou no levantamento topográfico e na construção da Usina Capivari-Cachoeira (Usina Parigot de Souza), por exemplo, dentre muitos outros projetos relevantes. Ela não parou por aí e também colaborou na construção de pontes e no levantamento de rios. Assim, atuou melhorando o aproveitamento hídrico das águas dos rios Capivari, Cachoeira e Iguaçu. Além disso, Enedina Alves Marques trabalhou no Plano Hidrelétrico do Paraná.

Os relatos de pessoas que viveram na época contam que Enedina Alves Marques era muito vaidosa e gostava de andar bem arrumada e maquiada em seu dia a dia. Entretanto, quando estava em uma obra, a vestimenta padrão era um macacão de operário com um cinto. Dizem também que era nesse cinto que a engenheira carregava a sua arma, pois percebeu que, por ser mulher e negra em um ambiente que era totalmente dominado por homens, precisava se fazer respeitar, ao perceber que levantar a voz não adiantava, Enedina resolveu adotar uma postura mais rígida e toda vez que os colegas homens não a deixavam falar ou adotavam alguma postura machista, ela dava tiros para o alto, para amedrontá-los e impor respeito.

Entre as décadas de 1950 e 1960, já com a carreira bem consolidada, a engenheira decidiu viajar com o objetivo de conhecer outras culturas. O pesar veio em 1958, com o falecimento do major Domingos Nascimento, que incluía como beneficiária Enedina no seu testamento, o que a surpreendeu. O militar quis demonstrar a todos o orgulho que sentia da menina que ajudou a criar. Seu reconhecimento mais evidente veio a partir da década de 1960, quando o sociólogo Octávio Ianni entrevistou Enedina como parte de sua pesquisa que se transformou no livro “Metamorfoses do escravo”. No mesmo ano, Enedina Alves Marques se aposentou pelo Estado do Paraná. Ela veio a falecer em 1981, aos 68 anos de idade, na capital do Estado do Paraná, devido a um infortúnio no apartamento em que vivia na cidade de Curitiba.

Em frente à instituição que formou a primeira engenheira do Paraná e do Brasil, existe apenas uma placa, uma homenagem feita por vereadores da década de 1980 em que se destacam 100 nomes da sociedade paranaense que foram relevantes para as políticas públicas ou para a história do povo negro, e ali está presente o nome de Enedina. Atualmente, Enedina Alves Marques tem seu nome no Livro do Mérito do Sistema Confea/Crea; em 2000, a engenheira foi reconhecida pelo Memorial à Mulher, ocasionando no seu reconhecimento junto a outras 53 mulheres pioneiras do Brasil em diversas áreas do conhecimento. Por fim, em 2006, foi fundado o Instituto de Mulheres Negras Enedina Alves Marques, em Maringá, no interior do Estado do Paraná. 

Enedina é fonte de inspiração para engenheiros e engenheiras, que veem em sua trajetória um motivo para persistir na carreira, até mesmo nos momentos mais difíceis. Esperamos que sua história de superação e força sirva como exemplo e inspiração a todas.

Referências

FARIAS, Vanessa. Enedina Alves Marques, a primeira engenheira negra do Brasil. Blog buildin: construção & informação. Santa Catarina. 21/03/2019. Disponível em: <https://www.buildin.com.br/enedina-alves-marques/>. Acesso em: 07/04/2021

MENDES, G. Celebrando Bertha Lutz – a bióloga brasileira que lutou pelo reconhecimento internacional da igualdade de gênero.  Blog Ciência pelos Olhos Delas. Campinas, São Paulo, 24/01/2020. Disponível em: 

<https://www.blogs.unicamp.br/cienciapelosolhosdelas/2020/01/24/celebrando-bertha-lutz-a-biologa-brasileira-que-lutou-pelo-reconhecimento-internacional-da-igualdade-de-genero/>. Acesso em: 06/04/2021

SANFELICE, P.P.; FLEIG, J. É preciso nomear a outra: a primeira engenheira negra do Brasil que ficou no rodapé da história-Enedina Alves Marques e a representatividade da mulher negra no Paraná.

SANTANA, J.L. Enedina Alves Marques: A Trajetória da Primeira Engenheira do Sul do País na Faculdade de Engenharia do Paraná (1940-1945). Revista Vernáculo, [S.l.], dec. 2011. ISSN 2317-4021. Disponível em: <https://revistas.ufpr.br/vernaculo/article/view/33232>. Acesso em: 07 apr. 2021. doi:http://dx.doi.org/10.5380/rv.v0i28.33232.

Conheça a história da primeira engenheira civil negra do Brasil. Blog Archtrends Portobello. Brasil. 11/12/2020. Disponível em: <https://www.google.com.br/amp/s/archtrends.com/blog/enedina-alves-marques/amp/>. Acesso em: 07/04/2021


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Maria Eduarda Brandão